Resumen
A história da humanidade tem-se desenrolado num mundo de mudanças constantes, por vezes lentas, outras rápidas, em parte devido a intervenções humanas, com as suas consequências intencionais ou involuntárias, e em parte devido a causas naturais. Não há nisto seguramente qualquer razão para pensar que, a médio e longo prazo, seja possível prever os acontecimentos futuros. Por não termos a capacidade de lidar com as grandes catástrofes, por limitações tecnológicas, econômicas ou políticas, a humanidade optou por resignar-se aceitando a vulnerabilidade diante dos eventos de grande magnitude (e mais raros), em troca de uma maior capacidade de lidar com as perturbações menores e comuns. As cidades, como espaços produzidos, ao mesmo tempo em que criam oportunidades civilizatórias, também se transformam em armadilha ambiental. A cidade é um sistema de fixos e de fluxos, que se relacionam e se produzem de forma contraditória. Para Santos (2002), estes derivam das intervenções sociais e econômicas no ambiente intra-urbano, por meio das relações entre os agentes sociais. Entretanto é possível admitir que dentre os tipos de fluxos que atuam no espaço urbano, numa perspectiva ambiental, encontra-se a dinâmica atmosférica e o ritmo climático, que funcionam como forças capazes de agir de forma a pressionar o sistema urbano, ao produzir tipos de tempo que afetam e, não raras vezes condicionam a vida cotidiana das cidades. Como a produção do espaço urbano segue a lógica da reprodução capitalista, portanto gerador de espaços segregados e fragmentados, longe de se produzir um sistema que respeite e se adapte às condições ambientais e naturais, é de se esperar que esta contradição resulte em impactos altamente sensíveis aos diversos grupos sociais que habitam a cidade de forma também desigual, tornando as desigualdades sociais, ainda mais agudas. Admitindo que, em geral, o equilíbrio entre o sistema urbano e o sistema climático é precário, então quanto maior o desequilíbrio entre estes sistemas, maior a vulnerabilidade urbana, principalmente nas cidades da periferia do mundo desenvolvido, como é o caso das cidades tropicais brasileiras. Se a cidade é o habitat da modernidade, se os sistemas urbanos são altamente complexos e desiguais e, se a atmosfera urbana é o produto da interação entre as variáveis do clima e as intervenções socioeconômicas, então os diversos grupos sociais não experimentam nem se relacionam com o tempo e o clima urbano da mesma forma. Espaços desiguais potencializam os efeitos do clima, que se manifestam, também, de forma desigual. Nesta perspectiva, tem-se que admitir que o clima urbano possa ser interpretado como uma construção social. Se o espaço urbano (os fixos) é uma armadilha, uma presa fácil para a ação dos eventos extremos numa visão fatalista, teríamos que aceitar o fato de estarmos ?condenados? à cidade ? à cidade enferma, como nos provoca Gaspar (2009). Mas, o espaço urbano também pode ser uma oportunidade (MONTEIRO, 2010), ainda que utópica, de construirmos uma cidade que seja o território da satisfação e da felicidade ? a cidade saudável.