Resumen
De forma inesperada, a nova pandemia do Covid-19 veio se somar às múltiplas síndromes interdependentes que configuram o agravamento acelerado da crise socioecológica global. Uma de suas características mais marcantes tem a ver com o fato de estar contribuindo para sinalizar a necessidade de revisões mais ou menos drásticas de modos de vida sancionados em praticamente todas as latitudes. Ao que tudo indica, as incertezas assim geradas abrem espaço para novos desenhos civilizatórios quase meio século após a realização da Conferência de Estocolmo. Os impactos previsíveis nas lógicas dominantes de regulação dos sistemas econômicos e político-institucionais representam um vetor decisivo que aponta nesta direção. Levando em conta este novo e inquietante perfil da crise global, objetiva-se analisar o potencial contido no enfoque ?pós-desenvolvimento-ecocêntrico? do Bem Viver, tendo em vista uma tomada de posição renovada no debate ecopolítico mais recente ? agora da perspectiva das novas linhas de reflexão que surgiram com a irrupção da pandemia do Covid-19. Explora-se o potencial criativo contido nesta controvertida noção à luz das contribuições seminais de Manfred Max-Neef sobre desenvolvimento à escala humana, e de Karl William Kapp e Ignacy Sachs sobre ecossocioeconomias. A intenção é balizar, de forma ensaísta, a elaboração de uma nova linha de reflexão acadêmica sobre os limites cognitivos e ético-políticos do pensamento neoliberal hegemônico, frente aos indícios cada vez mais inquietantes de comprometimento mais ou menos irreversível do metabolismo do Sistema-Terra.