Resumen
O presente artigo tem por fim analisar o processo de formulação e as consequências gerais dos dois últimos programas institucionalizados pelo governo federal no âmbito da saúde da mulher: a rede cegonha (portaria 1.459/2011 do Ministério da Saúde) e o sistema nacional de cadastramento e acompanhamento de gestantes e puérperas (medida provisória nº 557). Buscar-se-á demonstrar que tais programas somente podem ser plenamente compreendidos enquanto instrumentos para a efetivação do dispositivo penal (art. 124 da lei 7.209/84) proibitivo do aborto. A partir dessa hipótese central, serão expostos os efeitos mais sensíveis, tanto em termos de reconhecimento de identidades sociais quanto de distribuição de recursos, da possível implementação daquilo que dispõem os documentos referidos. Nesse particular, a linha de argumentação desenvolvida nos permitirá perceber que a estrutura dos dois programas reforça a lógica da exclusão e da desigualdade social, ao mesmo tempo em que incorpora uma representação social da mulher como ser humano desprovido de autonomia.